Rua dos Aflitos: luminárias japonesas são substituídas no bairro da Liberdade



Rua dos Aflitos: luminárias japonesas são substituídas no bairro da Liberdade em ação de reparação histórica

Na semana do Dia da Consciência Negra, luminárias japonesas da Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade, em São Paulo, foram substituídas por iluminação de LED. A decisão, fruto de reivindicações de movimentos negros, busca resgatar e dar visibilidade à memória histórica do local, que abriga a Capela de Nossa Senhora dos Aflitos e o antigo Cemitério dos Aflitos, um marco da história da escravidão no Brasil.

A Prefeitura justificou a substituição das luminárias, ocorrida em 18 de novembro, como uma medida para “equilibrar o respeito às diferentes camadas históricas e culturais do bairro” e atender à solicitação de entidades ligadas ao movimento negro. Enquanto isso, o restante da Liberdade segue com as tradicionais luminárias asiáticas, que homenageiam a imigração japonesa.

História de dor e resistência no Beco dos Aflitos

Antes de se tornar a Praça da Liberdade, a região era conhecida como Largo da Forca, local onde condenados à morte, em sua maioria escravizados e indígenas, eram executados. Próximo dali, o Cemitério dos Aflitos servia como local de sepultamento para populações marginalizadas, como escravizados, indigentes, presos e pessoas com doenças contagiosas.

A Capela de Nossa Senhora dos Aflitos, construída em 1779, ainda permanece no local como um patrimônio histórico tombado. Em 2018, arqueólogos encontraram ossadas de nove escravizados em um terreno próximo, comprovando a existência do cemitério, antes conhecido apenas por registros históricos.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) incluiu o sítio arqueológico no sistema de gestão do Patrimônio Cultural em 2020, reconhecendo sua relevância histórica para São Paulo. A descoberta revelou materiais associados às práticas culturais de matriz africana, como um colar de contas de vidro azul encontrado junto a um dos esqueletos.

Projeto Memorial dos Aflitos

Movimentos sociais reivindicaram, em audiências públicas, a criação do Memorial dos Aflitos no terreno onde as ossadas foram encontradas. O projeto foi sancionado em 2020 pelo então prefeito Bruno Covas, reforçando a importância de preservar a memória das populações que ali viveram e sofreram.

A Associação Amigos da Capela comemorou a troca das luminárias e destacou que a ação faz parte do projeto de reurbanização do Beco dos Aflitos, como um gesto de reparação histórica. "É uma vitória para nossos ancestrais, garantindo visibilidade à Capela e à história de resistência que o local carrega", afirmou a entidade.

A dualidade cultural da Liberdade

O bairro da Liberdade é um dos maiores símbolos da imigração japonesa no Brasil, com as tradicionais lanternas Suzuranto sendo um marco cultural. No entanto, o Beco dos Aflitos representa outra camada histórica, marcada pela dor e pela luta de populações marginalizadas.

A substituição das luminárias na Rua dos Aflitos representa um esforço para preservar e destacar a pluralidade histórica e cultural do bairro, garantindo que a herança de todos os grupos seja devidamente representada.

A mudança reforça o compromisso da cidade com a reparação histórica e o respeito à diversidade, especialmente em uma data tão simbólica quanto o Dia da Consciência Negra.

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